CARNAVAL DE 2019
SINOPSE DO ENREDOMburukujá – “…E Por Falar em Paixão!…” |
Esta é uma lenda que fala de paixão, e como no terreno da paixão tudo pode acontecer, aliado ao fato que numa lenda não existe limite entre o possível e o imaginado, passemos ao “causo” contado pelos ribeirinhos do auto rio Amazonas, em momento de pura criatividade coletiva:
Tudo se passou no século XVI, quando Gonçalo Pizarro, conquistador espanhol, comandou uma expedição a uma região rica em canela, a leste dos Andes, chegando ao rio Amazonas, informando ao reino espanhol a descoberta do mais volumoso dos rios.
Entre seus comandados, chegou à “Terra Brasílis” um capitão da Coroa, acompanhado de sua filha, uma formosa donzela espanhola.
Próximo ao acampamento espanhol, havia uma tribo indígena que passava por grande problema: a infertilidade de suas mulheres- o que levaria à extinção daquele povo.
O pajé dessa tribo era consolado pela profetisa Onça, que ouvira de Tupã que “a alma branca viria de além-mar para semear o amor e garantir a reprodução daquele povo”.
Foi aí que, numa das caçadas de um jovem cacique da aldeia, desbravando a mata virgem, este alcançou o acampamento dos homens brancos, e ali ficou a observar seus costumes, ficando extasiado diante à visão de tão bela moça branca.
Num dia, perseguindo a bela borboleta encantada, a donzela se embrenhou mato a dentro, perdendo o caminho de volta. O cacique ouviu seu choro, correndo para consolá-la, e levá-la de volta ao acampamento de seu pai.
Aquele encontro foi tão mágico, tão encantador, tão puro- a chamada “paixão à primeira vista”- que provocaria, mais tarde, a ira de Anhangá, o espírito mau da floresta, que tudo fazia para atrapalhar os desígnios de Tupã.
A partir desse dia, os jovens enamorados encontravam-se todas as tardes, escondidos, amando-se em segredo, pois o pai da moça jamais teria aprovado essa relação. Na verdade, seu pai já havia decidido que ela casaria com um capitão, que ele acreditava ser digno de obter a mão de sua única filha.
Quando lhe revelaram os planos de matrimônio, a jovem suplicou que não a condenassem a consumir-se junto a um homem que ela não amava, mas seus apelos só conseguiram aumentar a cólera de seu pai. A donzela chorou desconsolada, tentando comover o inflexível coração do pai, mas o velho capitão não só confirmou sua decisão; além disso, informou que ela deveria ficar confinada em casa até a celebração das bodas.
A triste donzela teve que se contentar em ver seu amado da janela, pois não estava autorizada a sair para os jardins e dificilmente conseguiria burlar a vigilância paterna. No entanto, enviou uma criada de sua confiança para informá-lo sobre seu triste futuro.
O jovem não se resignou a perder sua amada e todas as noites se aproximava da casa, tentando vê-la. Vigiava o lugar durante horas e só quando percebia que os primeiros raios de sol podiam delatar sua presença, retirava-se com seu coração triste, embora não sem antes tocar uma melancólica melodia em sua flauta, tirada do misterioso canto do uirapuru.
A moça não podia vê-lo, mas esses sons chegavam aos seus ouvidos e a enchiam de alegria, pois confirmavam que o amor entre ambos continuava tão vivo como sempre. Mas, uma certa manhã, já não foi embalada pelos agudos sons da flauta. Esperou em vão noite após noite a volta de seu amado. Imaginou que o jovem poderia estar ferido na selva, ou talvez tivesse sido vítima de alguma fera, mas não se resignava a crer que ele tivesse esquecido seu amor por ela.
A doce menina consumiu-se em tristeza. Sua pele, outrora branca e brilhante como as primeiras neves, tornou-se cinza e opaca, e seus olhos já não refulgiam com formosos brilhos violáceos. Seus lábios vermelhos, que antes costumavam sorrir, se fecharam em um triste esgar para que ninguém pudesse saber de sua pena de amor.
Entretanto, permaneceu sentada diante de sua janela, sonhando em ver seu amante aparecer. Depois de vários dias, viu entre as moitas próximas a figura de uma velha índia. Era a mãe de seu namorado que, aproximando-se da janela, lhe contou que o jovem havia sido assassinado pelo então noivo prometido por seu pai. Este, ao saber do oculto romance da jovem, tomou-se de uma ira incontrolável, sentimento preferido de Anhangá, que assim possuiu seu corpo, levando-o mata adentro para cometer tal crime.
A donzela, recobrando suas forças, e fugindo pela janela, seguiu a anciã até o lugar onde repousava o corpo do seu amado. Enlouquecida de dor, abriu uma cova com suas próprias mãos, e depois de depositar nela o corpo do jovem cacique, confessou à anciã que daria fim a sua própria vida, pois havia perdido a única coisa que a prendia a este mundo. Tomou uma das flechas de seu amado e depois de pedir à mulher que uma vez que tudo estivesse consumado, cobrisse suas tumbas e os deixasse descansar eternamente juntos, cravou-a no meio do peito, caindo junto ao corpo daquele que em vida havia amado.
A anciã observou surpreendida como as penas aderidas à flecha começavam a se transformar em uma estranha flor que brotava do coração da jovem, ao mesmo tempo em que araras-azuis revoavam em torno da tumba, afirmando sua natureza monogâmica, pois tal ave possui somente uma parceria amorosa em toda sua vida. Assim, a velha índia cumpriu sua promessa, cobrindo a tumba dos jovens amantes.
Não passou muito tempo antes que os índios que percorriam essa região começassem a falar de uma estranha planta que nunca tinham visto antes e cujas flores se fecham à noite e se abrem com os primeiros raios de sol, como se o novo dia lhes dera vida. Porém, essas flores não davam frutos, os botões se abriam em flores, murchavam e caíam, assim como a jovem espanhola, que virgem morrera. De tão exuberantes que eram, as pequenas abelhas não conseguiam polinizá-las, assim como nenhum homem possuiu a jovem. Assim, Tupã evocou o espírito do jovem cacique, materializando-o na grande abelha mangangá (tupi), sentenciando-lhe que eternamente iria pousar de flor em flor, polinizando-as, para que elas germinassem e dessem frutos. Isso feito, com o nascimento dos primeiros frutos, todas as mulheres da tribo do jovem índio engravidaram, para alegria do velho pajé, uma vez cumprida a profecia da amiga Onça.
Seus frutos, do tamanho de um ovo e de cor amarelada, é tão saboroso, que os índios o batizaram de Mburukujá- alimento em forma de cuia, o nosso maracujá.
O alvoroço entre os indígenas era tal, diante à beleza das flores, que despertou nos missionários espanhóis o interesse em conhecê-las, ficando em êxtase, achando que sua estrutura representava a Paixão de Cristo. As cinco pétalas e cinco sépalas, representavam dez apóstolos; as cinco antenas simbolizavam as cinco chagas de Cristo, os três estigmas faziam referência aos três pregos na cruz, os filamentos a coroa de espinhos… as flores seriam manchadas de roxo em virtude do sangue de Cristo; e o fruto redondo era a representação do mundo que o Cristo veio redimir.
As sementes do maracujá foram então enviadas de presente ao Papa Paulo V (1605- 1621), que mandou cultivá-las com grande carinho em Roma e divulgar que ela representava uma revelação divina.
Ao ver a flor do maracujá, o Papa também ficou extasiado e então a batizou de “Fruto da Paixão”, fazendo uma alusão direta ao calvário de Jesus.
Lendas, histórias… fato é que o maracujá desperta mesmo a paixão. Sua intrigante dualidade seduz a alma, por não ser, no campo sentimental, definitivamente conceituada, sacra ou profana, mas, por ser, ao mesmo tempo, única; é doce,… ou amarga; gera motivação, criatividade e ação, mas, ao mesmo tempo, relaxa e acalma; desperta sabores, … e a gula; é gostosa, … e perigosa!…
Mas no Morro do Dendê ela representa uma unidade: a Alegria!!!!!
E nossa Escola é Acadêmica no Samba, e cantamos aos quatro cantos nosso Hino impregnados de Paixão:
Dendê, amor
Razão, Paixão
Coisas do meu coração!!!!!!
Carnavalesco Luiz Guilherme Alexandre