CARNAVAL DE 2020
SINOPSE DO ENREDOSe Essa Rua Fosse Minha |
O ímpeto de caminhar. O instinto de sobrevivência que nos impulsiona a seguir adiante. A cada descoberta, uma conquista. Descortinam se novos horizontes. O Senhor dos Destinos é a Energia de Luz que dá asas aos nossos pés; é a fé que nos guia, abrindo os caminhos para o Beija-Flor passar e apresentar o voo lúdico “Se Essa Rua Fosse Minha” na mágica Avenida onde os sonhos ganham vida, através de foliões que, vestidos de fantasias, vêm brincar o Carnaval entre o real e a imaginação.
Odara ê! Que essa Energia de Luz ilumine o nosso percurso tal qual farol a nos guiar, firmando o nos so samba desde a encruzilhada do ponto de partida, até a linha de chegada.
Passo a passo, percorremos o caminho cientes de que não estamos sozinhos. Força motriz é farol a iluminar cada pedacinho do trajeto por onde vamos passar.
Enquanto conceito, o termo rua deriva do latim ruga, posteriormente “sulco, caminho“; que no contexto etimológico, histórico, cultural e turístico que abrange o senso coletivo e o imaginário popular, normalmente é compreendido enquanto o espaço público no qual o direito de ir e vir é amplamente assegurado.
Quantas experiências, viagens, transformações, realizações, até que o povo se tornasse o legítimo dono da rua… Porque há muito caminha a humanidade, e a nossa jornada tem início em tempos deveras longínquos… Gélidas eras imemoriais marcam o princípio dessa viagem carnavalesca; quando em algum momento, num passado distante, o Homem se viu de pé, e então, deu um passo à frente. Um primeiro passo, rumo ao desconhecido.
Travessias superando ventos frios, feitos de sociedades primitivas, antigas civilizações. Por necessidade, curiosidade e determinação, seguiu-se o fluxo. Invenções como a roda foram determinantes para a evolução.
É esse instinto de seguir adiante, fundamental para se manter de pé nas estradas da vida, que segue impulsionando homens e civilizações através dos tempos.
Andarilhos, solitários ou em grupos, seguem seus destinos, sem saber ao certo o que vão encontrar e aonde vão chegar; mas parado, não se chega a nenhum lugar, há que continuar o percurso…
O descobrimento de novas rotas trilhadas no passado interligam pontos longínquos, pessoas, estabelecem relações distintas; fomentam acordos, comércio, negócios.
No balanço das marés, estradas das águas conduzem ao Novo Mundo e revelam o Eldorado. Indígenas nativos cortam as florestas verdejantes e abrem as veias pelas quais desbravadores bandeirantes enveredam seguindo as pegadas deixadas, demarcando territórios. Enfim, a Estrada Real.
Gradativamente, mata, mato, pedra, pedaços de pés de moleques, calçamento, pavimentação, asfalto. O termo rua em seu sentido urbano e contemporâneo.
Enquanto a razão cimenta e solidifica o chão que a gente pisa, para que não nos falte o chão ou mesmo quando este parece abrir sob os nossos pés, é justamente nesse momento que buscamos o Caminho da Fé.
Valores e ritos escritos em livros sagrados alimentam a crença que move, remove e vence montanhas, operando milagres suplicados por devotos fiéis em tantos altares, diferentes andores.
Promessas, peregrinações, romarias, procissões. Símbolos divinos, santificados, rituais diversificados, que retratam o respeito e a reverência nas mais variadas crenças e filosofias. Joelhos dobrados, mãos impostas, olhares elevados aos céus, pedidos amarrados em laços de fitas, a busca incessante por sentido, direção, respostas, iluminação, redenção.
Estórias de brava gente guerreira que traça o seu destino, que busca realizar seus sonhos e desejos mais profundos, e assim, conquistar o mundo. Rotas terrestres, caminhos marítimos, progresso, multiplicação.
Ruas de diferentes cantos do planeta conquistam transeuntes e turistas, que vão e vêm, a contemplar a história de tantos recantos que despertam encanto, imortalizados em cartões postais, souvenires, lembranças; guardadas com afeto nas paredes da memória, feito um poema à beira mar.
E como dissemos antes, nessa mágica Avenida onde os sonhos ganham vida, o desejo é o que torna o irreal possível. A criatividade e a imaginação alçam voo e se encontram nas asas do Beija-Flor, pois o céu é o limite para quem ousa sonhar.
A mente vagueia, cruzando portais espirais, percorrendo vias celestiais em meio ao cintilar das estrelas, planeja erguer a Torre de Babel, encontra a saída para o labirinto do temido Minotauro, onde habitava a terrível criatura; enquanto a magia das setes cores do ar co íris revela o caminho dos gnomos para a prosperidade, onde tesouros
estão escondidos em potes de ouro. Não obstante, ladrilhos com pedrinhas de brilhante enfeitam o trajeto por onde vão passar os nilopolitanos, nossos verdadeiros diamantes.
É o festival de prata em plena pista, é o sorriso alegre do sambista, é a celebração do povo enquanto dono da rua, é a gira correndo na Avenida, é a rua do Beija-Flor!
Sob o véu da noite que nos envolve agora, céu e chão num turbilhão de estrelas, firma meu samba nessa encruzilhada, o seu ponto de partida, a esquina onde dobram sonhos de tantas vidas, onde os destinos são traçados na mágica Rua, na Rua do Marquês, que também é minha, é sua. Na hora em que a avenida se ilumina, a Lua, despida, torna-se vazia e então, para brincar o carnaval, põe-se a vestir-se de fantasia.
Laroyê! Peço licença às entidades, bênçãos e passagem aos que nos regem do além e peço que nos iluminem com seu rastro de luz, nos guiem e nos façam brilhar também. Hoje, meu “Pássaro Encantado” vem beijar o chão que pisa, ele, que é tão bem acostumado, vem contar mais histórias de rumos, rotas, trajetórias, caminhos e estradas por onde a humanidade passou.
Pelas vias riscadas na terra, minha gente por elas atravessou. Ainda sem fronteiras, conheceu reinos de Âmbar, de Prata, de Ouro e de Seda, seguindo os passos dos aventureiros viajantes com que o vasto mundo interligou.
No balanço das ondas, bravos navegantes nos caminhos do mar aberto, ao sabor do vento, com o saber dos astros que apontam para o oriente, partiram, pois navegar foi preciso rumo ao Cabo das Tormentas, destino impreciso que, por sua vez, acalma o oceano e conduz os viajantes ao Novo Mundo. Mundo por tantas lendas afamado, com tantos sonhos acalentados, de impérios longínquos, de tesouros escondidos, de estradas esculpidas no topo do mundo, de um mágico reino chamado Eldorado.
Eis que nova terra então se revela. No facão que fere a mata verdejante e impunha a bandeira donatária, ao desbravar a trilha dos índios, se faz Estrada Real, da Vila Rica, em chagas abertas no chão de onde brotaram ouro e diamantes, para a Corte de Portugal. E a nobre cidade sagrada, à São Sebastião, cobriu o barro de seus becos e vielas de pedras assentadas, pisadas por pés de moleques.
Ruas que assim também se fizeram rumos de devoção, estradas de passos peregrinos, “Paços” de milagres, andanças de louvação, vias dolorosas de flagelos e martírios, caminhos de pedidos e promessas, de graças e de perdão, no andar com fé em procissões e romarias, que seguem andores e altares, de Josés e Marias, no fervor das tochas e velas que acendem almas e corações.
Ruas sem fim que contam histórias. Ruas que conhecemos sem sequer passar por elas. Ruas do mundo afora que são cartões-postais, ou que simplesmente são lembradas por quem nelas moram. Ruas de desejos, de saudades, de lembranças de seus recantos e encantos. Ruas de todo canto, sejam elas as mais belas ou aquelas que nos atraem, simplesmente pelo seu vem e vai. Sejam elas a avenida elegante de Paris ou de Nova York, sei lá, talvez uma mão inversa de Londres ou “El Caminito”, em Buenos Aires, para “un tango bailar”; ou, melhor ainda, aquelas onde a brisa sopra de um “eterno cantor” em suas ondas ao quebrar, que espalham beleza e calor, nas calçadas famosas onde se declara amor à “Princesinha do Mar”.
Mas, afinal, são estradas fantásticas, lendárias, de se ouvir falar, ou, melhor, são elas talvez frutos que só a imaginação alcança, tão impossíveis de se chegar. Para que isso aconteça, basta querer e sonhar. E por que não deixar se levar nessa viagem que a mente pode criar, seja pela Via Láctea passear, ou a Torre de Babel alçar, e a morada de Deus visitar. Ou, quem sabe, desafiar a mitologia e, no Labirinto do Minotauro, a tão desejada saída encontrar; ou, talvez, num passe de mágica, na estrada de tijolos de ouro, no final do arco-íris, poder chegar.
Enfim, são tantos caminhos a percorrer, tantas estradas que se mostram naturais, virtuais ou do destino, estradas da vida de cada um de nós. Mas eis que chega ao fim essa viagem. É aqui o caminho do sonhar, na Rua das Ruas, a razão desse meu caminhar, onde mora nossa missão de vida, onde o samba escolheu habitar e de onde o meu povo chega de seu próprio caminho vindo do seu lugar. É a Rua de todos no seu momento de por aqui passar. Mas, agora, é a minha hora, a minha vez de lhes mostrar que essa Rua, nesse instante, é só minha e, como o sonho me permite, essa Rua eu vou ladrilhar com pedrinhas de brilhantes para o meu Beija-Flor voar.
ALEXANDRE LOUZADA E CID CARVALHO
Carnavalescos