G.R.E.S. RENASCER DE JACAREPAGUÁ |
Sinopse 2006 |
A selva escura Quando me encontrava na metade do caminho da vida, me vi perdido em uma escura selva de pedra, e minha vida não mais seguia o caminho certo. Ah, como é difícil descreve-la! Tão selvagem, cruel, amarga, que a simples lembrança daquela selva me traz de volta o medo. Creio que nem mesmo a morte é tão terrível. Mas para que eu possa falar do bem que dali resultou, terei antes que falar de coisas que do bem longe estão. Não sei como fui parar nesse lugar sombrio. Sonolento como estava, devo ter cochilado me afastando da via verdadeira. E ao chegar ao pé de um monte onde começava a selva que se estendia vale abaixo, olhei para cima e vi aquela ladeira coberta com os primeiros raios de sol. A cena trouxe luz a minha vida, afastou de vez o medo e me deu novas esperanças. Decidi então subir aquele monte. Olhei para trás uma última vez, para essa selva que nunca deixara uma alma viva escapar, descansei um pouco e depois iniciei a escalada. Havia dado poucos passos quando, de repente, saltou à minha frente um menino astuto como um felino. Parecia um gato do mato, e de todas as formas impedia que eu seguisse adiante. Não adiantava desviar o olhar, pois ele sempre estava lá, em meu caminho. Várias vezes tentaram afasta-lo dos caminhos desta selva. Várias vezes falharam. O dia já raiava e o sol nascia com as mesmas estrelas que acompanharam o mundo em seu primeiro dia. A luz e a claridade daquele dia especial renovaram minhas esperanças, e me fizeram acreditar que iria conseguir vencer. Mas a minha esperança durou pouco e o medo retornou quando vi, diante de mim, a falta de emprego. Impostos e taxas altas que arrancavam de mim o que restava, estava em todos os lugares a me atordoar. Eu era mais uma vítima acuada pelo voraz leão, que seguia sempre a avançar em minha direção com a cabeça erguida, tão faminto e raivoso que até o próprio ar parecia temê-lo. Seguindo este leão vinha uma imagem que mais se assemelha a uma loba magra, faminta e cobiçosa, que se aproveitando da miséria e da fome, ganha dinheiro colocando meninos em sinais de trânsito, e incentivando pequenos furtos, mostrando na alma humana seu pior lado. Transformando assim meninos em gatos do mato...
Esta visão tornou minha alma tão pesada pelo medo que me possuiu, que não vi mais esperança alguma na escalada. E avançando em minha direção lentamente, às feras me faziam descer, me empurrando de volta para aquele lugar onde a luz do sol não entra. Neste momento de aflição ouço o som de um batuque resolvi, então, seguir este som. Chegando lá me deparei com uma figura que vinha em minha direção. Uma silhueta humana que vinha de longe, de um lugar inconcebível para mim. Era um professor que apesar de mal remunerado encontrava tempo para se dedicar a um dos muitos projetos sociais espalhados por ai. Ele estava ali para me mostrar, e a quem mais quisesse ver, que existe saída desta selva escura. - porém eu teria que estar disposto a sair de tal situação. Ele seria meu guia, me alertando que o caminho seria difícil, e que ele só me conduziria até determinado ponto, e dali por diante eu deveria seguir meu próprio caminho. Então ele me apresentou a Monteiro Lobato, Carlos Drumond de Andrade, Machado de Assis e outros gênios da literatura brasileira. Que me ajudariam de alguma forma em minha jornada.
Logo passamos por uma fenda na terra e nos deparamos com a entrada do inferno, parece que naquele momento havia tomado consciência de parte da verdade, abri meus olhos e vi o que antes não enxergava. Nos deparamos com Caronte, o barqueiro que traficava almas para o inferno, na realidade ele prometia uma viagem alucinante mais seu fim sempre se dava no inferno. Atravessamos vias esburacadas, vimos rios transbordando, valas negras, bala perdida, etc... Uma situação de total abandono. Vimos gente com fome e sofrendo dos diversos males trazidos pela miséria.Gente que não tinha batismo; que mal sabia assinar o nome; gente que não tinha se quer certidão de nascimento. Gente sem oportunidade e sem opção. Todos ali, próximos à entrada do inferno. Chegando lá, vimos que a entrada era guardada pelo cão Cérbero e duas figuras franzinas que se assemelhavam a gárgulas em sua aparência, com foguetes nas mãos. No alto havia a seguinte inscrição: “Por mim se vai todas a dores, por mim se vai a ininterrupta dor; por mim se vai gente condenada. Foi justiça que inspirou o meu Autor, fui feito por poderes divinais. Suma sapiência e supremo amor. Antes de mim havia apenas coisas eternas, e eu, eterno, perduro. Abandonai toda a esperança, ó vos que entrais!” Lá se encontrava, logo no inicio os omissos, aqueles que podiam mais nada fizeram para mudar a ma situação do próximo. Nos outros níveis estavam simultaneamente os exploradores de trabalho escravo, os exploradores de trabalho infantil, os pedófilos, os traficantes, assassinos, fraudadores e ladrões, corruptos e corruptores de todas camadas sociais e, por fim, os políticos desonestos que acentuam e apimentam este inferno. No inferno, acompanhados por seus advogados, esses políticos negociam com o diabo e sua legião: propina, valor do mensalão e outras vantagens em troca do direito de não responder perguntas que venham a incriminá-los, e assim possam aliviar sua pena. Enfim, rezando para que tudo acabe em pizza e logo possa ser abafado por outro escândalo. Jamais esquecerei o que vi. Ninguém deveria esquecer.
Saindo do inferno, podemos avistar o purgatório. O purgatório é um lugar de expiação para aqueles que ainda não estão prontos para entrar na boa venturança do paraíso. A maior diferença entre o purgatório e o inferno é que no purgatório há esperança. Logo na entrada os portões são guardados por Pedro um sereno senhor de barbas brancas que nos informa que os anjos nos guiarão e nos guardarão dali até o fim de nossa jornada. As almas que aqui chegam são aquelas que por falta de tempo ou opção, abriram os olhos tardiamente, se arrependeram e decidiram mudar de rumo. Grandes filas são constantes, para que possa se conseguir vagas para saúde, educação e trabalho. Pois com trabalho e educação se dignifica a alma humana. Transformando cada um dos sete pecados capitais em virtudes. No purgatório todos trabalharão com este fim, o engrandecimento do ser humano. O que fortalece os pilares da nossa sociedade e permite o acesso ao paraíso. No purgatório, o fardo é pesado, a saúde é capenga, a educação é limitada e o emprego é informal. Ainda tem as ongs e projetos sociais que tem por finalidade tirar do ócio as almas que ficam a vagar. E é glorioso ver o momento em que cada alma descobre seu caminho. Existem muitas dificuldades, mas se elas não existissem não seria o purgatório e sim o paraíso.
Após esta longa jornada percebi que deixara para traz aquela selva escura e que a saída tinha vindo por intermédio da educação. A busca pelo conhecimento me trouxe sabedoria e discernimento, os contrastes são mais visíveis e já consigo identificar os caminhos que me levam ao paraíso, dos caminhos que levam a estagnação e empurram para o inferno. A cegueira de outrora deu lugar à luz e consigo enxergar meu caminho. Nele descobri meu grande amor, o som de batuques que me soam como clarins angelicais do paraíso. Se no purgatório a condição é o trabalho para engrandecer a alma, no paraíso a condição é o amor. O amor que tem o poder de transformar o mundo, o amor que movimenta a vida, o amor que nos permite deslumbrar este paraíso de encantos mil. Este paraíso habitado por gente otimista, versátil, alegre, festeira e hospitaleira. Gente talentosa, lugar de artistas, celeiro de bambas, gente que faz a maior festa do mundo abençoada pelas mãos do criador. Onde um coral de anjos, toca seus clarins, que se misturam a repiques, surdos, pandeiros e tamborins. E com um ritmo frenético mistura gente de todas as raças, classes, sexos, religiões. Aqui é o paraíso onde todos são filhos de Deus. Aqui se ama a vida e todas as mesquinharias são esquecidas em nome da alegria. Nem todos merecem estar neste paraíso, mas aqui sempre se da um jeitinho e sempre cabe mais um. Neste paraíso o povo pode expressar suas idéias e fazer com que sua voz chegue a cada recanto, com a benção do criador, pois se Deus é brasileiro o paraíso é aqui. E hoje se fazem presentes: Arlindo Rodrigues, Fernando Pinto, Viriato, Joãozinho Trinta, dentre expectadores, sambistas, carnavalescos, artesãos, enfim todos os que vêm de perto ou de longe para estarem aqui. Mostrando ao mundo que por traz desta selva escura, e de todos os males, o paraíso é aqui, junto do inferno e do purgatório. Pois diferente da obra original, relatada por Dante Alighieri, onde se separa o paraíso do purgatório e o inferno. Aqui tudo se mistura e se transforma em carnaval. Mais isto não faz com que nos esqueçamos das injustiças e sim, que levantemos nossa voz em prol de melhorias. E fazemos isto com uma propriedade impar, calor, alegria, amor, paz e muito samba no pé. Lane Santana |