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G.R.E.S. UNIÃO DA ILHA DO GOVERNADOR

Sinopse 2008

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"É HOJE O DIA!"


 

Mas afinal, que dia é esse? Que dia é esse que nos faz tremer, suar frio e o coração bater mais forte? Que nos faz sofrer sem dor? Que nos faz temê-lo e, ao mesmo tempo, ansiar pela sua excitante chegada? Que dia é esse que nos extrai o sangue, o suor e até mesmo nossas lágrimas? Que faz nossa individualidade ser completamente absorvida pelo êxtase coletivo?


"A minha alegria atravessou o mar e ancorou na passarela
Fez um desembarque fascinante no maior show da terra*"

Ilha, uma extensão de terra cercada de água por todos os lados. Por isso, todos os anos, a minha alegria atravessa o mar e ancora na passarela para fazer seu desembarque fascinante no carnaval! Foi também atravessando o mar que os negros africanos nos trouxeram sua alegria – é claro que não nos referimos às condições degradantes a qual foram submetidos no processo de escravidão, e sim ao caráter festivo dos povos africanos – e ancoraram por aqui toda a sua ancestralidade cultural.

Artífices de “mãos cheias” que talham, trançam, esculpem, pintam e forjam como poucos. Além das tradições plásticas, orais como o “griot” (pai do enredo) que narra as histórias de seus antepassados, e musicais como seus batuques, ritos e instrumentos. Música para a magia, para a fé, para o amor, para a guerra, para os homens conversarem com seus deuses...

Tambores, atabaques e afins, unindo-se aos cânticos e louvores. Suas Nações e dinastias vindas de várias partes da África, clamando por Olorum ou por Alá, fizeram o desembarque fascinante de suas culturas para lançar em nossa terra a semente que germinaria o maior show do planeta.

 

“Será que eu serei o dono dessa festa?
Um Rei no meio de uma gente tão modesta*”

Espalhando seus cantos, danças e crenças, a força do trabalho negro embalou nosso mestiço país menino. Das sonoras noites nas senzalas nasce o lundu misturado aos bate-coxas e umbigadas, estimulando a imaginação dos moradores da casa-grande. Com a chegada gloriosa do batismo cristão, ganhou-se o domingo para as festas e batucadas após a santa missa matinal, bem alinhados em roupas coloridas e vistosas. Festejos negros em homenagem a santos católicos florescem e, desta união sincrética, vão aparecer cerimônias, autos e embaixadas.

Coroações de Reis e Rainhas com seus séqüitos reais, misturando hierarquia africana com monarquia portuguesa em cortejos processionais. Muitos continham dramatizações e encenações em seu desenvolvimento, contavam e cantavam alguma história, como um enredo. Modelos estes, aliás, seguidos até hoje como formato de desfile pelas escolas de samba.

 

“Eu vim descendo a serra, cheio de euforia para desfilar
O mundo inteiro espera, hoje é dia do riso chorar*”

E o “cortejo” virou preferência na organização da brincadeira de carnaval, em resposta à bagunça agressiva do antigo entrudo português que emporcalhava as pessoas e a cidade. Grupos e comunidades se reuniam para desfilar fantasiados pelas ruas. Espocam as Sumidades, Cordões e Ranchos carnavalescos.

As “procissões” continuam, com o povo fantasiado tocando seus instrumentos, cantando e dançando, para misturar de vez as raças e classes. As turmas e famílias com fantasias unificadas inspirariam o surgimento das chamadas “alas” e as exibições das luxuosas e engenhosas alegorias das Grandes Sociedades influenciariam as escolas de samba na construção de seus “carros alegóricos”, além de nos presentear com a tradição das “comissões de frente” como os mestres de cerimônia dos desfiles.

 

“Levei o meu samba pra mãe de santo rezar
Contra o mau-olhado carrego o meu patuá
Acredito ser o mais valente nessa luta do rochedo com o mar*”

Sob as densas fumaças perfumadas dos incensos, rezado, benzido e iluminado pelas velas de cera dos barracões de fé, o nosso bom e velho samba é filho legítimo dos terreiros das religiões afro-brasileiras, com seus Orixás e entidades, herdando o misticismo, a musicalidade e a tradição dramática de seus pontos e louvores.

Marginalizado e perseguido, é gerado, alimentado e escondido nos fundos das casas das “tias baianas” na Praça XI. Mas o samba vencerá as dificuldades e ganhará força com o aparecimento das primeiras “escolas de samba”, que traduzirão em seus desfiles o histórico da influência e da resistência cultural negra na miscigenação de nosso povo.

 

“É hoje o dia da alegria
E a tristeza nem pode pensar em chegar*”

“É hoje!”. Assim exclamavam os negros nos preparativos dos antigos congos. Os foliões exclamam excitados para o grande momento, único e decisivo, para o qual se preparam o ano inteiro: o desfile de sua escola do coração. Revivem-se as tradições dos antepassados com todos os seus elementos se agrupando para compor uma só festa.

Das casas simples, das ruas de asfalto ou do alto dos morros, sai a nobreza do samba. Trabalhadores esquecem das dificuldades do cotidiano e têm seus dias de reis e rainhas, ou damas e fidalgos; homens e mulheres, jovens e velhos, ricos e pobres, comungam a santidade deste momento ancestral que corre nas veias de todos nós.

Da comissão de frente à velha guarda, a expectativa para a hora da explosão de euforia num misto de honroso dever e satisfação pessoal. A felicidade é insulana e alegria é sinônimo de União da Ilha do Governador, famosa pelos desfiles coloridos e memoráveis que traçaram o caráter apaixonantemente feliz da escola. É hoje o dia! A azul, vermelha e branca evoca seu passado glorioso rumo a mais uma conquista na construção de um futuro de vitórias. Caramba, segura a marimba que lá vem a Ilha!
 

“Diga, espelho meu, se há na avenida alguém mais feliz que eu?*”
Duvido.


Jack Vasconcelos (Carnavalesco)
 


BIBLIOGRAFIA CONSULTADA:

*Samba de Enredo “É Hoje”, Didi e Mestrinho. G.R.E.S. União da Ilha do Governador. Rio de Janeiro: Top Tape música ltda, 1981.
ARAÚJO, Hiram. “Carnaval: Seis Milênios de História”. Rio de Janeiro: Gryphus, 2003.
CASCUDO, Luís da Câmara. “Made in África”. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965.
ENEIDA. “História do Carnaval Carioca”. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1958.
FERREIRA, Felipe. “O Livro de Ouro do Carnaval Brasileiro”. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004.
LAN (pseudônimo). “As Escolas de Lan” / Ilustrações de Lan (Lanfranco Vaselli); texto de Haroldo Costa. Rio de Janeiro: Novas Direções, 2001.
MORAIS FILHO, Melo: “Festas e Tradições Populares no Brasil”. São Paulo, EDUSP, 1979.
MOURA, Roberto. “Tia Ciata e a Pequena África no Rio de Janeiro”. Rio de Janeiro, FUNARTE, 1983
RIO, João do. “As religiões no Rio”. Rio de Janeiro: José Olympio, 2006.
 

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